Se você soubesse o que sei sobre você…

Se soubesse o tanto que eu já sei sobre você, não deixaria – nunca! – de ser do jeitinho que é. Assim mesmo, moça. Assim, sem mudar nem um “tiquin”.

Se soubesse, meu bem, não controlaria – em hipótese alguma – o pavor que sente dos insetos voadores. Apenas saltaria – como fazem os gatos assustados – em direção ao meu colo.

Se soubesse de tudo o que eu já sei, meu amor, ao menor indício de barata, besouro ou gafanhoto você não hesitaria em começar a sambar – feito Globeleza possuída pelo Exu Caveirinha – sobre a mesa do restaurante lotado. O que a minha família pensaria? Não me importa. E se alguma tia-avó futriqueira disser que isso é falta de etiqueta e que você não tem educação prometo que, sobre um prato de espaguete, eu também sambarei. “Tamo” junto, certo?

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Se soubesse que já estou ciente do horror que você sente só de pensar em ter a roupa invadida por algum bicho pernudo, apenas correria – como a gazela que foge de um guepardo faminto – sem descer do salto ou se importar com o seio que, graças à sua manifestação de desespero, certamente escaparia do vestido.

Se soubesse do que sei, no mínimo, berraria: “Mata logo esse monstro! Matou? Ele morreu? Certeza? Mesmo?”.

Mas você não diz nada. Com medo de me assustar com a exposição da sua fobia, engole o grito e algema a vontade de ter chilique em praça pública.

Se soubesse que já sou capaz de ler você até no escuro e mesmo quando não me dá sílaba alguma, não fingiria cor quando está em PB. Não forçaria sorrisos quando não enxerga motivos para encantar o mundo com eles. Não diria: “Impressão sua, cabeça de jujuba. Está tudo bem comigo!”. Apenas, como nunca fez, aceitaria um gole da minha cachaça mais ardente, e sem se preocupar em parecer frágil – como às vezes sei que é, como todos somos quase sempre -, salgaria a lapela da minha camisa.

Se soubesse o quanto eu me amarro em ouvir você cantar em inglês – em um inglês que só você entende -, você não teria a mínima vergonha de deixar claro que ainda está no verbo “to be” quando o mundo todo parece ter se tornado poliglota. Pelo contrário: sempre que fosse flagrada inventando letras e transformando o condicionador em microfone, apenas aumentaria o volume da voz e, só para mim, faria um show particular.

Se soubesse como sou fascinado pela cara que você faz quando acorda, jamais correria para o banho como se estivesse desesperada para trocá-la por algo menos amassado, descabelado e borrado. Continuaria ao meu lado, apenas, aliviada pela certeza de que me derreto por sua beleza sem esforços, Photoshop ou efeitos especiais.

Se soubesse o que hoje sinto por você, não temeria, nunca, aquilo que já senti por tantas outras. Passada é passado, afinal. É página virada, ponte necessária para que chegássemos até aqui.

Se soubesse o tanto que eu já sei sobre você… Aliás, agora que você já sabe, peço que tente se livrar, de vez, de todos os “O que ele pensará de mim se souber que…”

Não se preocupe, eu já sei de tudo! E amo o que sei a seu respeito. Ou quase tudo, né? Porque odeio quando você faz jogo sujo – e enfia o dedo em minha orelha – para me vencer na lutinha.

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Ricardo Coiro

Ricardo Coiro

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