Eu acho o BBB um troço pra lá de chato, sinceramente. Mas isso não me torna mais inteligente ou melhor do que as pessoas que curtem o programa. Por que estou dizendo isso? Não, não é jabá. Digo por perceber que algumas pessoas têm metido o pau no programa global como uma maneira velada de autoelogio, um jeito barato de se autopromoverem. Manja? Como se elas fossem superiores apenas porque preferem ficar quicando entre o History e o Discovery Channel nas raras vezes em que fecham o livro de filosofia e ligam a TV.
O mesmo ocorre quando o assunto é literatura, música e cinema: pessoas maldizem best-sellers, “as mais tocadas” e blockbusters numa tentativa patética e desesperada de demonstrar superioridade intelectual. Você já viu isso, não viu? Eu já. Várias vezes! Em rodinhas de cinéfilos de aspecto vampiresco, inclusive, já tive vergonha de declarar o meu amor por filmes de ação, como James Bond e Jason Bourne. Preferi falar de cinema argentino e diretores que eles consideram o mais puro creme da sétima arte. Hoje não faço mais isso. E sabe por quê? Porque inteligentes, a meu ver, são aqueles que transitam sem culpa e preconceito entre os mais diversos universos, do cult ao pop; do “Hey jude” ao “Você sentando, mozão, me deu onda”; do Dostoiévski à J.K Rowling; do cinema japonês aos filmes do Van Damme.
É óbvio que Tolstói é tecnicamente superior a Dan Brown. Assim como Os Sete Samurais, de Akira Kurosawa, é muito mais arte do que Duro de Matar. Mas há dias em que só precisamos de algo que nos distraia, que simplesmente nos dê prazer, qualquer lance que não exija de nós extrema concentração ou repertório artístico. Não é mesmo? Sendo assim, qual o problema de dar play no Walking Dead e se alimentar de mortos-vivos naqueles dias em que o trabalho fundiu nosso cérebro? É falta de intelecto? Burrice? Em minha opinião, não! Pelo contrário: para mim, a maior bestialidade é rejeitar as próprias vontades para consumir certos conteúdos que dão mais moral, que pegam melhor nas redes sociais e jantares cheios de metidos a inteligentes. E quando falo em “conteúdo”, não me refiro apenas ao conteúdo cultural, não: falo também de comidas e bebidas, por exemplo. Pois o mundo está cheio de gente que opta pela cerveja gourmet – mesmo preferindo a Skol – porque dá mais coraçõeszinhos no Instagram. Pode reparar. Coisa parecida tem ocorrido com o bacon, que se tornou um símbolo de “foderosidade-viking” e, por isso, vem sendo ostentado nas redes sociais até por pessoas que não gostam tanto assim dele.
Se antes eu me forçava a beber um vinho por causa de elogios que enólogos tinham feito a ele, hoje, antes de tudo, eu ouço as minhas vontades e prazer, e dou preferência ao consumo – no sentido mais amplo da palavra – daquilo que me satisfaz, independente da safra e do número de estrelas que recebeu de especialistas com olfato de cães farejadores. Saca? E não me sinto nem um pouco culpado quando coloco gelo no uísque, para a aflição dos meus amigos entendidos em derivados de malte. Eu gosto assim, ué! E a vida me parece demasiadamente curta para ser vivida apenas de acordo com os mandamentos questionáveis da crítica.
Entendo que preciso ler os livros clássicos e aclamados para evoluir tecnicamente em meu ofício de escritor, entendo e os leio, sem hesitar; no entanto, há momentos em que eu prefiro folhear uma revista cujo conteúdo é raso e de fácil absorção, e assim faço sem a culpa que um dia me perseguiu, fazendo-me assinar a revista Piauí – da qual não lia mais do que um artigo por mês – em vez de outra mais parelha ao meu gosto.
O passar do tempo tem me ajudado a separar as coisas que faço para mim daquelas que realizo para me adequar ao padrão de qualidade do outro. Mais do que isso: tem me feito admirar aqueles que não dão ouvido aos críticos e insistem – sem disfarçar e em nome da própria satisfação – em coisas consideradas socialmente menores e, muitas vezes, até mesmo abomináveis, como ketchup na pizza e sertanejo no iPod.
Assumir preferências e vontades exige coragem em doses cavalares, principalmente quando – apesar de inofensivas – estão em desacordo com aquilo que é socialmente considerado melhor/correto. Compreende? Pois é o mesmo que andar sem máscaras num mundo que vive a aplaudir os mascarados, mesmo ciente de eles só cobrem o rosto por medo do que vão pensar de suas verdadeiras faces.